Execução em Recuperação Judicial

Recuperação judicial: o que e como funciona esse processo?

Execução em Recuperação Judicial

O principal motivo de embaraços quando uma empresa solicita a recuperação juficial ou entra em processo de falência é a execução dos créditos contra a entidade. A Execução em recuperação judicial é um dos temas mais buscados no momento da notícia de que uma empresa com grande porte anuncia a sua recuperação judicial, isso porque as dívidas que a empresa possui serão encaminhadas à uma espécie de fila de pagamentos ou, no termo técnico, créditos concursais. Assim, todas as dívidas serão escalonadas nos termos da Lei de Falências – Lei nº 11.101/2005, valendo-se a Lei de uma classificação de dois gêneros principais, os concursais e os extraconcursais.

O legislador organizou os pagamentos dos credores de acordo com sua natureza e prioridade, bem como prevê o pagamento em duas grandes classes. Inicialmente, pagam-se os créditos extraconcursais (art. 84), e depois os créditos concursais (art. 83). É certo que, somente se avança para a categoria seguinte, se a anterior estiver totalmente satisfeita; não havendo ativos suficientes para pagamento total da categoria, faz-se o rateio proporcional.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ deu provimento ao Recurso Especial nº 1.655.705/SP, no qual se consolidou o entendimento de que a existência do crédito é determinada pela data que que ocorreu o seu fato gerador (cf. STJ. REsp nº 1.840.531/RS. 2ª Seção. Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Data de julgamento: 09.12.2020. Data de publicação: 17.12.2020). Sendo assim, no caso de uma sentença reconhecer o dano moral ou material, que implique no pagamento pela empresa em recuperação, não significa que o crédito foi constituído após o pedido de recuperação, mas sim se o motivo que ensejou a ação judicial ocorreu antes do pedido de recuperação.

O tema é importante pois caso o fato gerador ocorra após o pedido de recuperação judicial o crédito não será submetido ao concurso universal de credores, mas pago normalmente com a intimação do devedor, ou seja, seria mais benéfico ao credor não participar da lista de credores que segue uma ordem bem definida.

A título de exemplo, recentemente tivemos o caso da 123 milhas, que requereu a recuperação judicial em agosto de 2023, assim, todos os processos que discutem fatos que ocorreram antes do pedido serão submetidos ao concurso de credores e, caso não seja incluído o seu processo, será necessária a habilitação do crédito no processo de recuperação judicial, com o fim de apurar todos os valores a serem adimplidos e em qual categoria o seu processo será incluído. No entanto, se caso a 123 milhas houver lesado alguém após o pedido, esse crédito não participará do concurso de credores, o que poderá ser objeto de uma ação judicial sem restrições de pagamentos. Veja um quadro resumido da recuperação judicial:

COVID-19 e o aprofundamento da crise -reflexos na recuperação judicial​​ - Arone Coutinho Advocacia

Nesse sentido, abaixo destacamos essa lista de forma simplificada como serão pagos os créditos no concurso de credores.

Concurso de credores

Em suma, para os créditos que participarão do concurso de credores, serão adimplidos inicialmente os que são considerados créditos extraconcursais:

– As despesas cujo pagamento antecipado seja indispensável à administração da falência.

– Os créditos trabalhistas, de natureza salarial, vencidos até 3 (três) meses antes à decretação da falência e limitados a 5 (cinco) salários-mínimos por trabalhador.

– Os valores entregues ao devedor em recuperação judicial pelo financiador.

A referida previsão tem como objetivo, incentivar instituições financeiras a concederem linhas de crédito, via DIP Financing, para empresas em estado de insolvência, pois diminuem os riscos da operação financeira, considerando que em caso de falência, os referidos credores recebem os valores com prioridade.

– Os créditos em dinheiro que são objeto de restituição (art. 86), .

Nesse sentido, a restituição em dinheiro é feita nas seguintes hipóteses:

I – se a coisa não mais existir ao tempo do pedido de restituição, hipótese em que o requerente receberá o valor da avaliação do bem, ou, no caso de ter ocorrido sua venda, o respectivo preço, em ambos os casos no valor atualizado;

II – da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação;

III – dos valores entregues ao devedor pelo contratante de boa-fé na hipótese de revogação ou ineficácia do contrato;

IV – às Fazendas Públicas, relativamente a tributos passíveis de retenção na fonte, de descontos de terceiros ou de sub-rogação e a valores recebidos pelos agentes arrecadadores e não recolhidos aos cofres públicos.

– Os créditos derivados da legislação do trabalho e de acidente do trabalho relativos aos serviços prestados após a decretação da falência, bem como a remuneração do administrador judicial e reembolso ao comitê de credores.

Importante mencionar que a Lei 11.101/05, prevê em seu artigo 24, que 40% (quarenta por cento) do montante devido ao administrador judicial será reservado para pagamento após a prestação de contas e relatório final da administração.

– As obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência.

– As quantias fornecidas à massa falida pelos credores.

– As despesas administrativas e processuais do processo de falência e as custas judiciais relativas às ações e às execuções em que a Massa Falida tenha sido vencida.

– Os tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência.

 

Sucessivamente, serão adimplidos após os extraconcursais, os créditos concursais, que são classificados da seguinte forma:

10º – Os créditos derivados da legislação trabalhista, com limite de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos, por credor e os decorrentes de acidentes de trabalho, devendo ser considerado o salário-mínimo vigente na data do pagamento.

É certo que os valores derivados da legislação trabalhista que superarem o limite de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos serão pagos como quirografários. Cumpre esclarecer que os valores decorrentes de acidente de trabalho não possuem a limitação de valores imposta aos créditos derivados da legislação trabalhista. Ainda, importante destacar que os créditos equiparados ao trabalhista, também se encaixam nessa categoria, e possuem o limite de valores tal qual previsto alhures. Nesse sentido, se enquadram como créditos equiparados ao trabalhista: i) comissões de representantes comerciais (art. 44 lei 4.886/1965); ii) honorários advocatícios (Resp 1.152.218); iii) honorários de outras profissões liberais (Resp 1.851.770); iv) qualquer crédito que tenha natureza alimentar (Resp 1.799.041).

11º – Os valores que envolvam direito real de garantia, quais sejam, hipoteca, penhor e anticrese, limitados ao valor do bem gravado.

A apuração do valor do bem dado em garantia ocorrerá de acordo com sua alienação, durante a liquidação dos ativos na falência. Imperioso esclarecer que o produto da venda do bem dado em garantia não fica vinculado ao pagamento do crédito garantido.

12º – Os créditos tributários, decorrentes de fatos geradores anteriores à decretação da falência, com exceção dos créditos anteriormente classificados como extraconcursais e as multas tributárias.

13º – Os créditos quirografários, que são os créditos originários de obrigações simples, sem garantia real.

Conforme retro mencionado, também são classificados como quirografários os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento e os valores derivados da legislação trabalhista que excederem o limite de 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos.

14º – As multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, incluídas as multas tributárias.

15º – Os créditos subordinados, que são os créditos com previsão em lei ou contrato e os dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício ( 83, inciso VIII).

16º – Os juros vencidos após a decretação da falência.

Por fim, cumpre aclarar que a nova ordem de pagamentos, advinda com a entrada em vigor da Lei 14.112/2020, aplica-se às falências decretadas ou convoladas após a entrada em vigor da referida lei, salvaguardando a segurança jurídica. A alteração da Lei 11.101/2005, decorrente da entrada em vigor da Lei 14.112/2020, simplificou e organizou o pagamento dos credores no feito falimentar, corroborando com os princípios da celeridade, economia processual, universalidade e indivisibilidade do juízo falimentar.

Maiores informações, bem como o inteiro teor do acórdão proferido no REsp. nº 1.655.705/SP.